O presente do psicanalista, nas diferentes acepções em que se pode escrevê-lo, escutá-lo ou lê-lo, é lidar com a relação mantida pelo sujeito que o procura com o gozo decorrente do encontro traumático que teve com a língua do Outro. E se ele, em sua prática, segue a trilha aberta por Sigmund Freud e renovada por Jacques Lacan, espera-se que o faça advertido de que não deve condicionar essa relação do sujeito a nenhum esquema evolutivo que pretenda apreendê-la, julgá-la ou avaliá-la segundo resultados tidos como melhores ou mais adequados à vida. A pragmática de sua clínica, portanto, refere-se não apenas a necessidades pregressas ou decorrentes do que traumatizou o sujeito e o faz sofrer, mas primordialmente à contingência envolvida nos acontecimentos decisivos de sua existência e em como, desde então, ele se vira com isso. À luz dessa posição ética concernente ao sofrimento humano, apreende-se que, em psicanálise, a clínica antecede aos avanços teóricos, ou seja, que a teoria psicanalítica só se sustenta ancorada no primado da prática. Como Jésus Santiago elabora com elegância, são as descontinuidades e rupturas verificadas na prática clínica que provocam e, mesmo, exigem as mutações conceituais que servem de bússola ao analista, a serem entretecidas, no ensino de Lacan e em sua leitura orientada por Jacques-Alain Miller, em quatro eixos: o inconsciente, o tempo, o sintoma e o corpo. Em termos mais precisos, o inconsciente, a princípio estruturado como uma linguagem, passa a ser concebido não sem o tempo e o sintoma, inicialmente tomado como uma substituição significante, faz-se presente não sem o corpo.