Capitalismo e subdesenvolvimento na América Latina é um livro decisivo para nós brasileiros tal como o foi para os demais latino-americanos desde sua primeira aparição há mais de meio século (1970, Siglo XXI Editores) cujas edições se multiplicaram sem cessar durante décadas. Entretanto, não seria mera curiosidade perguntar as razões pelas quais um livro que tanta influência exerceu no pensamento social latino-americano jamais recebeu a atenção nacional e, a despeito de outros títulos do autor terem sido publicados no Brasil, ninguém se interessou em sua publicação. Não temos dúvida a respeito: as teses exibidas aqui destruíram completamente não somente os graves “erros” de um marxismo vulgar, mas, sobretudo, dirigiriam o esforço intelectual para um terreno responsável por levar as novas gerações de cientistas sociais e militantes para a crítica, sem vacilação alguma, contra um certo orgulho burguês que ainda navega entre nós de maneira tão desinibida quanto nociva. Não há, portanto, outra razão para explicar a ausência de sua publicação aqui, senão uma clara censura editorial que era tão inaceitável durante a ditadura quão cínica após a implantação do regime liberal burguês em 1985. A democracia, entende-se bem, é antes de mais nada um sistema de dominação da classe dominante e seus cúmplices liberais de todos os matizes que não toleram os hereges ao estilo Gunder Frank ou outro qualquer. Há, de fato, um controle completo do pensamento crítico entre nós, especialmente agudo nas universidades que, ao contrário do que professam, não suportam a crítica e detestam as melhores expressões do pensamento crítico latino-americano. Esse controle não aparece como o que realmente é, ou seja, uma censura tão eficaz quanto aquela exercida pela ditadura. Ao contrário, é apresentada em primeiro lugar como um exercício rasteiro de adesão às novidades da Europa e dos Estados Unidos, as migalhas ideológicas que decorrem de duas regiões que expressam os graves problemas do desenvolvimento capitalista em escala global. A ausência dessa publicação exibe, portanto, uma clara forma de censura especialmente grave num país no qual o liberalismo de esquerda clama pela diversidade e tolerância na batalha das ideias. É necessário observar que esse “controle das mentes numa sociedade democrática”, não é produto da ação dos monopólios de comunicação e das casas editoriais, mas, sobretudo, um produto direto das opções da esquerda liberal e de sua crônica impotência diante da dependência e do subdesenvolvimento que, finalmente, caracterizam nossa realidade social. Nildo Ouriques