Entre silêncio, palavra e delírio , de Natalie Salazar, explora os caminhos poéticos das memórias e palavras silenciadas ao longo da história familiar da artista. A obra apresenta experimentações gráficas que se desdobram em imagens, textos e ausências – resultado de um processo investigativo que atravessa questões históricas e pessoais. Publicado pela Editora & Galeria Degustar, o llvro conta com uma tiragem limitada de 500 cópias numeradas, e foi organizado e editado pela curadora, professora e pesquisadora Galciani Neves, com posfácio de Patrícia Wagner, curadora, escritora e pesquisadora. Concebido a partir de uma residência artística na Casa do Povo, em SP, o trabalho é formado por páginas que mesclam trechos de um diário escrito pela artista durante essa experiência, com outros pensamentos projetuais que foram pensados em diálogo com objetos, vestígios e histórias deixadas por seus avós. A memória desses parentes, marcados pelo preconceito imposto aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial, é um dos pilares da obra. Durante a imersão na instituição, Salazar optou por realizar sua pesquisa na biblioteca da instituição, onde teve acesso a livros antigos e desgastados na língua iídiche, idioma falado por seus avós, nascidos em Dabrowa, na Polônia. Embora não dominasse a língua, o contato com os textos permitiu que a artista se relacionasse com o idioma de forma poética e subjetiva, criando uma nova narrativa compartilhada na publicação. Com 384 páginas que convidam à reflexão e pausas, o livro de artista apresenta uma sequência de imagens e anotações, que se entrelaçam sem seguir uma ordem cronológica, e são perpassadas por inúmeras páginas vazias que convidam a um tempo de leitura em que o silêncio ou o devaneio se fazem presentes. O trabalho sugere uma sobreposição entre o presente e o passado, entre projetos, encontros e experiências vividas e acumuladas. Entre os trabalhos apresentados no livro, estão registros de livros da biblioteca da Casa do Povo, registros de performances realizadas nesse espaço, e ainda, obras anteriores, como Inventário, que envolve a aquisição dos 14 romances escritos por Michael Bruckner, avô de Salazar. Esses livros foram mantidos envelopados, exatamente como chegaram pelo correio. O resultado final do livro tem projeto gráfico de Fernanda Porto, que em um trabalho conjunto com Natalie e Galciani Neves, chegou a um objeto com especificações que traduzem a dimensão do seu conteúdo: o título em relevo baixo quase desaparece na capa branca, criando uma sensação de silêncio tátil; a ausência de lombada faz referência aos livros manuseados pela artista durante sua residência, enquanto o cinza, quase branco das páginas, na fonte e na costura, remete à ausência. A publicação conta ainda com dois encartes que têm como intenção propor uma coreografia de manuseio para além da página tradicional. O primeiro, feito de papel vegetal, traz a frase “a pele e suas dobras: ali guardam segredos afônicos” com a fonte em uma cor da mesma tonalidade da página onde se encontra, tornando-se visível apenas quando o papel é retirado. O manuseio do papel vegetal cria marcas ao longo do tempo e, assim, emula o modo como a pele vai envelhecendo. O outro encarte é fechado com uma serrilha, que, ao ser aberto, revela uma fotografia de livros mofados que foram encontrados durante a residência na Casa do Povo. Entre silêncio, palavra e delírio é uma obra que resgata memórias familiares e reflete sobre a arte como ferramenta de reconstrução e transformação. Ao combinar textos, imagens e experimentos gráficos e táteis, Natalie Salazar propõe uma experiência sensorial que transcende o tempo, abordando questões profundas de identidade, herança e o silenciamento de vozes. O lançamento, no dia 8 de abril, oferece uma chance única de vivenciar uma obra que vai além do livro, tornando-se um objeto artístico e reflexivo. Sobre a Editora & Galeria Degustar A Degustar nasceu da amizade entre pessoas com horizontes pessoais e profissionais distintos unidos pela apreciação comum das coisas boas da vida: boa mesa, boa cama, boas companhias, boas leituras, boas imagens, boas viagens. Da partilha inicialmente restrita de informações e experiências garimpadas, surgiu a ideia de socializá-las com um grupo ampliado de amigos, conhecidos(as) e – por que não? – ilustres desconhecidos(as). Assim, nasceu a editora, que vem buscando insistentemente aliar texto e imagem, forma e conteúdo, nos domínios demarcados da literatura.
Marca: Não Informado