O romance Por entre a solidão das fragas, é-nos apresentado numa escritaesquelética, sem gordura, tal como a terra magra das ladeiras transmontanas,com os piçarros logo à flor da relha da charrua e do arado.Fontes de Carvalho descreve magistralmente de forma crua e brutal o viver deum povo massacrado e teimoso de uma aldeia pobre e esquecida do NordesteTransmontano! Um povo rural, castigado e feliz, no dizer de Aquilino.O romance desenrola-se nas décads de 30, 40 e 50 do século passado, emque o povo vivia arrochado e os costumes eram caninamente vigiados pelostrês poderes: o prior, o regedor e o burguês. Mesmo assim, punham a honraacima de tudo, um povo que Miguel Torga questionou: Que povo este! Fazem-lhe tudo, tiram-lhe tudo e continua a ajoelhar-se quando passa a procissão!.- Cala-te, mulher. Negro é o carboeiro e branco o seu dnheiro.- Mas tu queres bander a tua filha a um demónio daqueles, a um soberbãodaqueles??! Tu só bês dnheiro, home de Deus? O dnheiro no se come. E a honra? Onde fica a honra?- perguntou irritada, batendo no peito com a mãoaberta.- Sei lá eu o qué isso da honra? Olha, fica prós pacóbios cmo tu,quacreditam nessas cousas. Enquanto timpingem essas lérias, eles vão-segobernando à nossa custa e inda se riem e inda nos tchamam tchabascos etchotchos! Dai-me dnheiro e no me dedens conselho. Dou rezão à nossaLucinda.- Eu tamãe penso cmó Pai. A honra tamãe no se come e às bezes é sóprátrapalhar a gente disse a Lucinda, sentindo-se apoiada pelo Pai. -A gentebem oube o padre a decer cousas do altar abaixo, mas óspois bem bai jantar acasa dos ricos e a combiber co eles. E alguns no têm honra ninhuma. Nuncátiberam nem eles nem os seus antepassados disse abanandoafirmativamente a cabeça. Palabras de mel e coração de fel rematouindignada.- Pois não! Claro qua honra tamãe no se come, mas ajuda-nos munto aenfrentar os dias menos bôs disse filosoficamente a Tia Germana. Marca: Ipê das Letras