Investigações atentas sobre publicações científicas nos permitem entender a capilaridade de um campo do conhecimento, os interesses políticos e ideológicos que lhes são subjacentes e suas conexões acadêmicas nacionais e internacionais. Em se tratando da solidez de um órgão como o ibge, o livro que se publica agora – Uma história para o futuro: quatro leituras sobre a Revista Brasileira de Geografia do IBGE – não apenas desvela novos olhares sobre uma publicação de marcado peso institucional (que, em um Brasil de democracias titubeantes, muitas vezes nublou seu inegável valor científico) como resgata a devida importância de um dos periódicos mais longevos da geografia brasileira. Negando a crítica anacrônica e óbvia – sem dúvida, tratava-se de uma instituição pública marcadamente conservadora, cuja Revista somente poderia se ancorar nas geografias que se pensavam em seu tempo –, as “quatro leituras” aqui expostas se caracterizam pela análise cuidadosa e minuciosa de um relevante capítulo da história da geografia no Brasil, indevidamente apagado pelo afã “crítico” mas que vem sendo paulatinamente recuperado. A relação entre o Departamento de Imprensa e Propaganda (dip) e a Revista Brasileira de Geografia, em pleno Estado Novo, assim como as modificações profundas, conflitos e transformações socioespaciais pelos quais passou a sociedade brasileira desde os anos de 1930 até o início da redemocratização, se por vezes escapavam diretamente aos artigos da rgb, estavam presente em suas entrelinhas – algo que só pesquisas profundas podem nos mostrar. Verdadeira usina de produção geográfica, o IBGE não se furtou a estabelecer contatos com as geografias produzidas nos Estados Unidos, na Alemanha e na França. Nesse tom, nos anos em que a RBG se aproximou das tendências da geografia francesa “Ativa” e das geografias neopositivstas, questões ambientais e planejamento também confirmavam o quanto tantas perspectivas da geografia, incluindo visões geopolíticas a serviço da ditadura militar, mesclavam-se, desmistificando as velhas noções das “correntes” do pensamento geográfico as quais, supostamente, suceder-se-iam umas às outras num triunfalismo de (controversos) paradigmas. A riqueza deste livro, portanto, é essa: a partir da Revista Brasileira de Geografia, abrir as portas para pesquisas cujos rumos e contribuições não saberíamos apontar hoje; mas nesse futuro agora inaugurado. Paulo Roberto de Albuquerque Bomfim
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